- novembro 20, 2024
- Pr. Válter Sales
A segunda:
“Hoje estarás comigo no paraíso” (Lc 23.43). A graça faz-se instantânea quando a fé é plena. O aparente choque temporal entre advérbio e verbo, de presente e futuro, num único ato, está a indicar a atemporalidade de Deus, sua supremacia sobre o tempo.
Nenhuma opção hermenêutica se sustentará diante desta chave: o centro de todo estudo neste campo é a Pessoa de nosso Senhor Jesus Cristo.
Sobressaem a fé e a entrega total, num momento extremo. A hora da graça é a hora da resposta de Jesus, sua submissão à vontade do Pai.
Sem arcabouço teológico, sem soteriologias, sem a aparato eclesiástico, sem intermediações… Todas estas coisas têm elevada importância, desde que se omitam de interferir no agir de Deus.
Dois homens em completa desgraça, sob o tacão da lei e do julgamento dos homens, ladeando a Redenção e o Redentor.
A condenação é a mesma para eles e para Jesus. A diferença é que a justiça (não a justiça aplicada ao crucificado do meio), por vezes, torna-se apanágio da sanha humana desprovida de amor e de verdade (Lc 23.40, 41).
Na cisão de uma existência mundanal, um condenado à morte recorre à graça e é salvo – “Hoje…” (Lc 23.43b). A graça de Deus não se põe em agenda humana.
A par das divergências que há no uso do advérbio, no presente, seguido de um verbo, no futuro, há a considerar-se uma possível confluência de ambos, a abastecer a lógica da realidade perene do propósito salvífico.
Por que um verbo no futuro, se a ação é “hoje”, e “estarás”? É que o destino do penitente é, a um tempo, final e eterno. O agir da graça não é circunstancial, ocasional, temporário. Transcende as condições e o tempo. O “hoje” e o “estarás” se conjugam numa ação para a eternidade.
Grande ênfase deve ser dada ao poder incomensurável do arrependimento. Não há dúvida de que o desventurado pedinte se arrependeu e se confiou por inteiro ao Justo – “… este nenhum mal fez”; “lembra-te…” (Lc 23.41b, 42).
A misericórdia não espera para amanhã, mesmo que não enxerguemos seus efeitos ou ela se imiscua nalgum silêncio.
Na experiência de um filho de Deus, ela se renova sempre (Lm 3.22, 23).
