- novembro 22, 2024
- Pr. Válter Sales
A quarta:
“Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste?” (Mt 27.46). Sob o peso esmagador do nosso pecado, por instantes o Filho viu-se desamparado do Pai.
Alguns porquês se desvendam numa realidade muito profunda. No caso de Jesus, muito profunda e muito dolorosa.
Mas não foram as chibatadas, nem os socos, nem os empurrões e as cusparadas que mais doeram e mais o humilharam.
Nem mesmo uma coroa de espinhos cravada na cabeça do Rei dos reis. Nem ainda a cruz, sob cujo peso Ele tombou, desfalecido, na via dolorosa – rota fatigante para o Gólgota.
Não foram os cravos perfurocortantes, nas mãos e nos pés, que tornaram lancinante a sua dor.
Não. O que lhe causou a dor mais aguda foi o momento dramático em que se viu separado do Pai – “… por que me desamparaste?”
Naquela hora toda a carga de pecados da humanidade pesou sobre Ele. Naquela hora Jesus sentiu-se “não-Deus”, porque Deus não pode sofrer as penas pelo pecado dos homens (Mt 17.17c).
Ser Deus e, por instantes deixar de ser Deus, representou o maior sofrimento moral e espiritual para Jesus. É muito difícil de entender isto? É contraditório? É ilógico? Entendo. Mas, não é uma questão de lógica humana. É questão reservada à soberana vontade, ao desígnio eterno do Pai.
A dor da alma deixa cicatrizes que se não desfazem facilmente com uma simples plástica ou um verniz religioso; mas tão somente pela operação do Eterno e Poderoso Senhor.
Teria Deus desamparado Deus? Não creio ser este o mais lúcido caminho exegético. A solução vem com Isaías e com Paulo (Is 53.3ss; Fp 2;5-8).
Cabe aqui uma reflexão para além de possível emoção causada por esses relatos. É quando Paulo diz: “Tende em vós o mesmo sentimento…” (Fp 2.5).
Como reflexão: tudo o que o profeta escreveu, todo o castigo, foi assumido. Estava destinado a nós, em razão da queda (Gn 3). Jo 3.16 explica tudo.
E as exortações de Paulo quanto ao esvaziamento? (Fp 2.7a). E não nos aponta Jesus as condições para quem se disponha a segui-lo? (Lc 9.23-26).
Toda a boa reflexão, em não sendo apenas um diletantismo intelectual, igualmente gera compromisso moral.
