- dezembro 12, 2024
- Pr. Válter Sales
A sétima VII – O Espírito, o Todo –
“… entrego o meu espírito” (Lc 23.46). Já houvera entregado tudo, o temporário e o permanente. Agora, entrega-se a si mesmo. Deu-se todo!
A história que culminou com a morte de Jesus no Calvário, não é um fato circunscrito ao julgamento, ao Getsêmani, à via crucis e ao próprio cenáculo. Este não se confinou num ato único e estanque.
O sacrifício de Jesus vê-se real já antes da fundação dos tempos; desde os arcanos da eternidade (1Pe 1.18,19; Ap 13.8-10). Tudo em Jesus é consumado, ainda que não falemos de uma escatologia voltada apenas para o futuro.
Nada ficou incompleto ou por fazer. Sua obra foi perfeita – “Tudo está consumado” (Jo 19.30). Isto nos fala de desígnio e de plenitude do que Ele realizou.
Quanto bem faríamos nós em impregnar a vida dessa dinâmica e dessa determinação! Em certa medida, Jesus mostrou ser possível ao homem fazer o que Ele mesmo, como homem, fez (Jo 14.12). As proporções desses feitos ficam sob elucidação da exegese e da hermenêutica.
Ocorre, porém, que somos exímios e entusiastas iniciadores e melancólicos concluintes. Com isto, subtraímos à vida conquistas que muito lhe valeriam.
Quando Jesus entregou seu espírito ao Pai, fechou o conjunto de sua obra. Era sua forma de dizer: “Tudo que me deste para fazer, foi feito” (Jo 10.29, 32, 33; 20.30, 31; 21.25). Nada ficou inacabado. Jesus fez e ensinou o suficiente para crermos em Deus, e mais o que nos excede.
A entrega do espírito é o coroamento de tudo. A frase, nos evangelhos de Mateus (27.50) e Marcos (15.37), também indica a voluntariedade e a realidade de sua morte. Tudo nele foi verdadeiro. Jesus não costumava fazer cena… Ora, aos pregadores melodramáticos, histriônicos, cabe observar esse magno exemplo.
O espírito não poderia ser morto pelo algozes romanos. O corpo foi entregue. O espírito, não. Pertence a Deus – o mesmo que acontece aos humanos (Ec 12.7).
O que aqui se detecta e desponta dos ditos dos evangelhos é a voluntariedade de Jesus ao entregar-se completamente à vontade do Pai. Neste aspecto, indicam-se sua humanidade e sua identificação conosco, em nossa natureza. A “morte” do pecador é necessária para a eclosão da nova vida.
A frase última fala-nos de triunfo. O Filho saiu do Pai e, agora, volta para o Pai. Nada poderia destruir essa relação essencial, nem poderia Ele permanecer rendido à sanha sanguinolenta dos homens.
Cabeça inclinada e vida entregue. Não é, para nós outros, hoje e sempre, uma indicação de postura? – “Enquanto é dia…” (Jo 9.4).
